sábado, 25 de agosto de 2007

Luciana Whitaker > Bala Perdida

Acho que foi num plantão de sábado quando eu coordenava a fotografia da sucursal carioca da Folha de S. Paulo que fiz essa foto. Aquela hora o jornal já estava quase fechado. Foi na Tijuca. Teve um assalto a um carro forte e uma senhora de 42 anos chamada Elvia Monteiro da Silva (seu nome ficou impresso em minha memória) estava dirigindo alí perto, parada no sinal vermelho, seu marido ao lado e a filha no banco de trás. Com o tiroteio entre policiais e os ladrões do carro forte, uma bala perdida atravessou o pára-brisas e atingiu em cheio o cérebro da senhora.

Quando estava tirando a foto, lembro que um outro fotógrafo falou assim para mim: “Tem um polarizador aí? O reflexo está péssimo.” E emprestei o polarizador, mas sabia que a foto precisava do reflexo do céu para suavizar a dureza da imagem.




A foto chegou a entrar no jornal, mas saiu em preto e branco, mal impressa, quase desapercebida numa página interna do caderno de cotidiano. A Folha parece não ter dado muita atenção a essa foto. Mas lembro que recebi alguns fax e telefonemas de jornalistas conceituados elogiando minha foto.

No dia seguinte encontrei um amigo fotógrafo na rua. Quando me perguntou como eu estava, comecei a chorar ainda engasgada com a violência do que tinha presenciado. Tinha sido uma semana de fotos barra-pesada.

Na semana seguinte uma das revistas semanais, não sei se a Veja ou a IstoÉ deu bem a foto numa matéria sobre a violência urbana carioca.

A foto foi indicada ao prêmio Esso 1994 e acabei levando a menção honrosa.

Quando o fotógrafo da Magnum Josef Koudelka veio ao Brasil, viu essa foto numa exposição em São Paulo e depois no Rio, veio falar comigo sobre ela. Adorei, ele é um dos meus fotógrafos preferidos.

Essa é a história da minha foto. Para mim ela é importante por tudo isso e por mostrar a crueza da violência urbana da minha cidade com uma imagem tão violenta e delicada ao mesmo tempo.

Luciana Whitaker > começou a trabalhar para jornal no New York Newsday em 1988. De volta ao Brasil trabalhou por oito anos na Folha de S. Paulo, seis deles como editora da sucursal do Rio de Janeiro, cobrindo de viagens internacionais com o presidente ao tráfico de drogas nas favelas. De 1996 a 2004 morou com esquimós no extremo norte do Alasca, documentando a cultura e a tradicional caça de baleias. Hoje em dia Luciana vive entre o Rio e o Alasca, fotografando para veículos jornalísticos como Folha de S. Paulo, Reuters, Isto É, Anchorage Daily News, o governo esquimó em Barrow, Alasca e agências de arquivo como Olhar e Pulsar Imagens. Está produzindo um livro editado pela Ediouro e um documentário sobre sua vida com os esquimós.

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