sábado, 25 de agosto de 2007

Rogério Reis > O Poeta vira Estátua

Transcrição do depoimento de Rogério Reis (gravado em 07 de maio de 2007), a respeito de sua foto do poeta Carlos Drummond de Andrade na Praia de Copacabana (1982), reproduzida em bronze pelo escultor Leo Santana.

Foto histórica?... A foto do poeta Carlos Drummond de Andrade, a que hoje é estátua, ali na na Av. Atlântica... Todo mundo pára ali... Dá um peteleco nele, senta para conversar... É a foto que deu origem à forma da estátua, então acho que é...
Foi uma foto que eu fiz no período da Veja. Enfim, foi uma foto construída. Porque estava na casa dele e pedi para ele ir até a praia. E lá fizemos essa foto.
Eu lembro que o Drummond me perguntou assim: “por que você está pedindo para eu ficar de costas para o mar?” Como bom mineiro, né ?... Enfim...
“Por que você está pedindo para eu ficar de costas para o mar?”...
E eu disse: “não... [Rogério gagueja] É porque... A minha proposta aqui é que o leitor veja o mar, por isso é que você está de costas para o mar...”
[Rogério imita Drummond] “Ah!...Então tá!... Vamos homenagear os leitores!”


E, aí, foi isso... Ele foi até a praia... Ele não costumava caminhar na direção de Copacabana. Eu sei, que era vizinho dele, ali no posto 6... Ele sempre caminhava em direção ao Leblon...
Outra coisa que... Curiosidade que posso contar também, é que no dia da inauguração da estátua fui convidado...E tava lá... E o nosso prefeito César Maia... De improviso, não sei, não pesquisou, não se preparou, supôs que o Drummond... Err... Ele supôs... Achava que o Drummond andava diariamente ali, não sei baseado em quê, né?... E aí o César Maia, o prefeito, diz assim, que, naquele ato solene – ... ali... com microfone...a imprensa presente – ele diz assim: “Estamos inaugurando a estátua do poeta Carlos Drummond de Andrade, nessa praia tão bonita de Copacabana – foi mais ou menos assim, né – tão bonita de Copacabana, onde o poeta diariamente passava, refletia e criava seus versos”, não-sei-o-quê...
O Drummond, né?... Nesse momento o neto do Drummond, o Pedro, os editores do Drummond se olharam e disseram, pensaram: “pôxa, o que tá acontecendo?”... Né ?... “Não é o Drummond”. Porque o Drummond não tinha o hábito de caminhar na praia.

Então, por que você acha que essa foto serve de referência?

Eu acho que deve ter sido... Eu nunca investiguei isso, mas deve ter sido pela... Pelo projeto de localização da estátua... Eu acho que eles devem ter decidido assim: “vamos botar a estátua do Drummond aonde?... Drummond morou em Copacabana, no posto 6. Então, o melhor lugar para se colocar uma estátua não vai ser na Barata Ribeiro... Vamos botar na praia, porque é um lugar visitado, mais amplo, mais aberto...”
Um ponto turístico, né?... E eu acho que pesquisaram e chegaram a... “Será que existe uma foto?... Será?... Aqui tem uma foto do Drummond, que eu já vi publicada. Ela – a foto – já foi publicada algumas vezes. Que ele está sentado num banco da praça...”
E aí concluíram, “vamo bota ele lá”... E reproduziram a foto.

Você acha que representa bem o Drummond, essa foto-estátua?

Eu acho que não... Acho que... Eu fotografei o Drummond várias vezes, principalmente quando ele fez 80 anos. Eu acho que a minha foto que representa o Drummond na sua intimidade, em casa, é ele sentado no chão da sala, né?
Que eu tava fazendo um ensaio com ele em casa, ele no escritório, na sala. Tava fazendo um perfil do Drummond. Ele em casa, andando, na rua, na sala, no escritório, e aí, de repente eu perguntei para ele – já tinha uma certa intimidade, por estar ali há algum tempo –, avancei e perguntei: “poeta o que é que gostaria de fazer, que o senhor faz em casa mas que não foi fotografado?”
Eu estava falando da intimidade, eu queria avançar um pouquinho por aí, né?, tentando seduzir ele para fazer uma foto mais íntima.
E ele disse: “olha... Tem uma coisa que é estranho pra burro, nunca fotografaram, mas também não sei se pega bem, que é.... Eu gosto de sentar no chão...”
“Perfeitamente, senhor – fiz uma alavanca –, “o senhor senta aqui”, e coisa e tal... E aí, fiz essa foto...

Eu acho que essa foto, para mim, ela representa mais o Drummond na sua intimidade, dele, do que ele na praia, sentado num banco, onde ele nunca... Não costumava freqüentar... Um lugar que ele não costumava freqüentar.

Mas representa a relação dele (Drummond) com a cidade?


Eu acho que sim... Rio de Janeiro... Tá ali, numa área aberta... Não deixa de representar...
Mas eu gosto mais da outra!...




Rogério Reis > nasceu em abril de 1954 no Rio de Janeiro e descobriu a fotografia nas oficinas de arte do MAM-Museu de Arte Moderna, nos anos 70. Trabalhou no Jornal do Brasil (1977), no O Globo (1980), na revista Veja (1983), e participou do Grupo F4 de fotógrafos independentes dos anos 80. Durante 3 anos seguidos (85 a 87), fotografou Ayrton Senna para o Banco Nacional, a convite da agência de publicidade MPM. Foi durante 5 anos editor de fotografia do Jornal do Brasil (91 a 96). Em 1999 recebeu o Prêmio Nacional de Fotografia da Funarte. Inspirou e emprestou seu nome ao personagem do fotógrafo no filme Cidade de Deus, de Fernando Meirelles, baseado no livro do escritor Paulo Lins. Em 2007 passa a integrar o grupo de fotógrafos do projeto da UNESCO, Our Place - the Photographic Celebration of the World's Heritage.
É um dos fundadores da Tyba (1991), onde trabalha como editor de projetos especiais; autor do livro Na Lona, Editora Aeroplano (2001) e co-autor dos livros Revisitando a Amazônia de Carlos Chagas - Editora Fiocruz (1996) e Retratos de Outono - Editora Sextante (1999).

2 comentários:

Madalena Barranco disse...

As fotos de Drummond são de uma sensibilidade incrível - dignas de figurarem num museu... Por exemplo o da Língua Portuguesa. Mostram que a poesia eterniza-se também na figura do grande poeta brasileiro. Parabéns e obrigada por compartilhar essa parte da história. Abraços.

Unknown disse...

Rogério Reis é o Cara! Fotógrafo de rara sensibilidade. Drummond? Bem, Drummond gostava um pouco de fotografia (basta ler o que ele escreveu sobre as fotos de Evandro Teixeira)e imperava no Olimpo das palavras.